Graciliano Ramos nos 120 Anos de seu Nascimento

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Fernando Morais, Antonio Prata, Ferreira Gullar e outros falam à CULT sobre o autor de “Vidas Secas”.

No dia 27 de outubro, comemoram-se os 120 anos de nascimento do escritor Graciliano Ramos (1892-1953). Leia a seguir o depoimento que alguns dos principais escritores da atualidade deram à CULT sobre a obra do autor de Vidas Secas e São Bernardo.



Fernando Morais:

“Eu devia ter uns sete, oito anos quando li o primeiro livro da minha vida. Chamava-se Sete histórias verdadeiras, de autoria de Graciliano Ramos, o autor brasileiro preferido do meu pai. Nunca mais abandonei Graciliano. Li, reli e treli tudo o que ele escreveu.

Com as inúmeras mudanças da família, o livro desapareceu. Quando minha filha Rita nasceu, tentei achar Sete histórias verdadeiras em sebos e livrarias de colecionadores, e nada. Todos me garantiam que esse livro não existia, e que o autor jamais escrevera uma obra com esse nome. Quando fiquei amigo de Ricardo Ramos, filho de Graciliano, ele desfez o mistério: tratava-se de uma seleta de pequenas histórias extraídas do livro Alexandre e outros heróis.

E foi então que eu soube também que o livro servira de inspiração para um dos mais populares quadros de Chico Anísio, cujo bordão central era uma frase do personagem principal, um exímio mentiroso: “É mentira, Terta?”.
Hoje, quase sessenta anos depois, é de Alexandre e outros heróis que me socorro para recontar aquelas histórias para as netinhas Clarisse e Helena. Na minha opinião, Graciliano está no primeiríssimo time dos autores brasileiros, um escritor do coturno de Machado de Assis. Sua obra é eterna.”

Antonio Prata:

“Estou escrevendo um livro sobre a minha infância. São pequenos contos, crônicas e fragmentos, em parte ficção, em parte memória – esse subgênero da ficção. Para isso, li alguns autores que também escreveram relatos autobiográficos de seus primeiros anos.

Li Infância, do Gorki. Li Infância, do Coetzee. Li Infância, do Graciliano. E é ridícula a altitude da qual o livro do Graciliano contempla seus pares. Perto dele, Gorki parece um iniciante, frouxo e prolixo. Coetzee, coitado, fica aguado, cinzento.

Já no primeiro parágrafo, Graciliano estabelece uma profundidade e uma beleza que você pensa: impossível ir assim até o fim. Mas ele vai. Com aquele lirismo seco, teso, vai tirando leite de pedra. Não dá pra falar dele sem lembrar daquela sua frase tão citada, “palavra é pra dizer, não pra brilhar”. Pois é. Mas quando diz, como ele diz, ilumina tudo o que tá em volta: ou seja, brilha.

Espero que uma das consequências desses holofotes todos que estão sendo apontados para o Brasil nos últimos anos seja a projeção internacional do Graciliano Ramos. Não para nos exibirmos, não. É que é muito egoísmo deixá-lo só para a gente. O mundo merece lê-lo. Um dos maiores autores do século passado. Nosso russo de Quebrangulo.”

Ferreira Gullar:

“O Graciliano é um escritor único. Tem uma personalidade definida, um estilo elaborado e que, ao mesmo tempo, revela um temperamento exigente, rigoroso. Há nele uma certa rudeza como personalidade, na maneira de enfocar as coisas, ao lado disso uma exigência estilística, uma depuração muito grande. Eu acho que isto faz dele uma personalidade única na literatura brasileira.

Meu livro preferido é Angústia. É o mais rico e substancial, mais apaixonado. Foi o livro que mais me impressionou por sua densidade, pela riqueza de caracteres e figuras humanas.

É muito rico como ficção e, ao mesmo tempo, como uma visão da vida brasileira, do nordeste. Mas reconheço que Vidas Secas é um livro estilisticamente mais perfeito, melhor realizado.”

Marcelino Freire:

“O primeiro romance que li na vida foi São Bernardo. Fiquei impactado com aquela literatura concisa, com a leitura desse livro, então fui atrás dos outros dele.

Quando leio Graciliano Ramos eu aprendo a pontuar. Eu nunca vi usarem tão bem uma vírgula como ele. Toda vez que eu vou usar uma exclamação, penso no Graciliano. Me sinto muito influenciado por ele. Me encanta a concisão, a objetividade, construção de personagens, falas, capítulos, é tanta coisa, meu Jesus.

Geralmente quando falam de literatura contemporânea, dizem que ela tem muita influência do cinema, essa maneira rápida de pontuar, esse estilo cinematográfico, mas eu peguei tudo isso do Graciliano. Toda essa mania dos microformatos vem muito do olhar dele, da concisão dele.”

Joca Terron:

“São Bernardo é meu livro preferido. Eu gosto da virulência do personagem protagonista e, sem dúvida, de um aspecto metaliterário. Esse é um aspecto que existe em São Bernardo e não é muito levado em consideração quando se fala da obra dele.

Tenho a impressão de a coisa se dividir em dois aspectos: o que todos sabem, aquela prosódia enxuta, que afetou positivamente a profissão literária no Brasil. E o outro caráter é o papel que ele já cumpriu, o lado oposto da literatura um pouco mais barroca, mais exagerada, mais incontida, e que talvez faça falta hoje. Talvez ter alguns anti-gracilianos fosse positivo para a literatura brasileira hoje.”

Fernando Bonassi:
As qualidades da literatura do Graciliano são bem conhecidas, tornaram-se até lugares comuns do que significa o escrever bem, limpo, enxuto etc. Junto com estas qualidades, admiro nele também um certo comportamento moral, a impressão de que é meio besta e quase uma vergonha, ser escritor, dar-se ao imaginário, num país pobre, burro e violento como este em que vivemos.

“Angústia” é um livro supremo, por tudo o que é Graciliano e pelo destemor com que revolve as vísceras do mesquinho e do estúpido.

Paulo Lins:

“São Bernardo é o meu predileto. Autor de escrita justa, poética. A construção de seus personagens é tão bem feita que eles ficam gravados em nossa memória pra sempre. Parecem que são reais.”

 

 

Fonte: Revista Cult 

 

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