Os Olhos Negros de Deus

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O nascimento de Ferdinando havia sido fruto de um evento fenomenal, já que sua mãe era estéril. Seus pais criam fervorosamente que em tudo na vida havia um propósito, e nada acontecia por acaso. Para qualquer coisa que ocorria, aparentemente boa ou ruim, invariavelmente diziam isso.

Apesar de Ferdinando apreender este ensinamento, uma coisa o intrigava: os olhos azuis de seus pais eram alvos de sua profunda admiração, mas os seus, negríssimos, o indignavam. Ele era uma criança que transbordava felicidade, mas esta situação começou a intrigá-lo profundamente.

 

Aqueles lindos olhos azuis contrastavam com os olhos negros jabuticaba de Ferdinando, o que o levava a sonhar em ter os mesmos olhos dos seus pais. Achava que quem tinha olhos da cor do céu ensolarado era porque havia sido prestigiado pelo próprio Deus-Criador.

O menino cresceu, e ao mesmo tempo em que seus pais quase que o constrangiam em afirmar que em tudo há um propósito, este desejo excelso de ter olhos azuis continuava o incomodando. E Já mais maduro, decidiu levar esta questão com veemência a Deus:

- Deus, agradeço por minha família; eles são maravilhosos. Mas gostaria de te pedir uma coisa, mais uma vez: quando eu despertar pela manhã, quero ter olhos azuis como os deles!

 

Assim, Ferdinando expressou sua fé genuína. E pela manhã, de fato se confirmou um evento extraordinário! Alguns médicos trouxeram uma resposta intrigante:

- Houve um milagre neste sentido a cada dia. Isto é, aquilo se confirmava a todo instante, pois ainda que não houvesse genealogicamente razão, seus olhos, Ferdinando, constituíram-se inexplicavelmente negros.

É! Intensamente negros. Os médicos tinham chegado à conclusão de que nem era para Ferdinando ter olhos diferentes da cor azul de seus pais. Por fim, era uma simples questão de genética para revelar que esta, sim, era uma situação inusitada.

 

Passaram-se três anos e Ferdinando se formou; agora ele iria perscrutar eventos e situações extraordinárias consoantes aos fatos jornalísticos. Quando completou vinte e um anos foi à Colômbia junto com alguns colegas jornalistas. Realizou um sonho. Colômbia!? Ali eram evidentes os intensos conflitos sociais. A vida, ele aprendera, era para ser espreitada, esquadrinhada; ninguém deveria usá-la para fazer turismo. 

Será que o que Ferdinando queria mesmo era confirmar o que os seus pais tanto diziam, concluindo que para o propósito ter razão de ser é necessário investiga-lo e provar o porquê de sua manifestação?

 

Numa área de tribo guerrilheira, organização terrorista criminosa naquele país, e para não ser confundido como um estrangeiro, precisou se passar como alguém natural daquele lugar. Puseram sobre as cabeças avultados chapéus de palha...; trajaram-se todos como nativos. Aparentavam serem, indiscutivelmente, pessoas dali.

Depois que passaram pelos guerrilheiros, já livres de perigo, um dos colegas fitou por um instante os olhos de Ferdinando e teve um despertamento, como um lampejo:

- Você já pensou como você faria para se disfarçar se tivesse olhos azuis como os de seus pais?!

E Ferdinando finalmente viu.

 

Sesinando Fontes
http://sesinandofontes.blogspot.com

 

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