Monteverdi

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Claudio Monteverdi era filho de Baldassare Monteverdi e Maddalena Zignani. Seu pai era barbeiro-cirurgião, uma tradição familiar, e sua mãe era filha de um ourives. Teve duas irmãs e três irmãos. A tradição médica de sua família, segundo Ringer, pode ter sido uma influência em sua inclinação para a observação da natureza humana, refletida mais tarde em suas óperas, e o seu concomitante envolvimento com a ciência, a causa de ele ter se interessado por toda a vida pela alquimia como um passatempo privado. Quando estava com oito anos perdeu a mãe, e seu pai logo contraiu novo matrimônio com Giovanna Gadio, com quem teve mais filhos, mas esta segunda esposa também faleceu precocemente, e em 1584 Monteverdi conheceu outra madrasta, Francesca Como. Monteverdi casou-se com Claudia Cattaneo em 1599, e tiveram os filhos Francesco Baldassare (n. 1601), que se tornou músico, Leonora Camilla (n. 1603), morta logo após o nascimento, e Massimiliano Giacomo (n. 1604), que formou-se em Medicina.
Os primeiros anos de sua carreira são de difícil reconstrução. Em data ignorada se tornou aluno de Marc'Antonio Ingegneri, mestre de capela da Catedral de Cremona e músico de renome internacional, mas não sobrevivem registros dessa ligação salvo sua citação sumária no frontispício das primeiras obras que publicou, mas segundo toda a probabilidade seguiu as praxes de seu tempo, sendo educado no contraponto, canto, instrumentos e composição, e possivelmente participando como menino cantor no coro da Catedral até sua voz mudar. Mesmo sem conhecermos os detalhes da pedagogia de Ingegneri e de seu progresso, sabe-se que este foi rápido, pois com apenas quinze anos já publicava uma coleção de 23 motetos, as Sacrae Cantiunculae tribus vocibus (Veneza, 1582), que traem uma dependência direta do estilo de seu mestre mas já são obras competentes. No ano seguinte publicou outra coleção, Madrigali Spirituali a quattro voci (Brescia, 1583), e em 1584 mais outra, Canzonette a tre voci. Em 1587, surgiram os Madrigali a cinque voci, Libro Primo.
Não se sabe a data exata da partida de Monteverdi para Mântua; ele pleiteara emprego em outros locais, sem sucesso, mas em 1590 estava empregado como violista na brilhante corte ducal de Vincenzo I Gonzaga, e logo entrou em contato com a vanguarda musical da época. Neste período os madrigalistas mais avançados estavam desenvolvendo um estilo de composição baseado na doutrina dos afetos, que buscava uma ilustração musical de todas as nuances do texto. Os poetas mais prestigiados, Torquato Tasso e Giovanni Battista Guarini, faziam uma poesia altamente emocional, retórica e formalista, e os músicos se esforçavam por captar esses traços e descrevê-los através de uma série de convenções de melodia e uma original pesquisa harmônica. As primeiras obras que Monteverdi produziu em Mântua evidenciam uma adesão a estes princípios, embora não os dominasse de imediato, e o resultado tivesse melodias angulosas e difíceis de cantar, e uma harmonia com muitas dissonâncias. A mudança de estilo parece ter prejudicado sua inspiração, pois publicou muito pouco nos anos seguintes.

Em 1595, acompanhando seu patrão, iniciou uma viagem pela Hungria, e quatro anos mais tarde outra para Flandres, onde deve ter entrado em contato com os últimos representantes da escola polifônica franco-flamenga, que fora muito influente na Itália. Em 1599 casou-se com uma cantora, Claudia Cattaneo. Em 1602 assumiu o posto de mestre de capela do duque, o que representou um aumento de ganhos, de prestígio e de trabalho, e também aborrecimentos, posto que seu salário era pago irregularmente e o tratamento que recebia do duque, pelo que registrou em sua correspondência, não era sempre o mais respeitoso. Recebeu cidadania mantuana e mudou-se de sua casa nos subúrbios para alojamentos nas dependências do palácio ducal. Nos anos seguintes publicou mais dois livros de madrigais, com algumas obras-primas que já mostram uma perfeita assimilação do novo estilo, resolvendo os problemas de ilustração musical do texto sem perder de vista a coerência da estrutura e a fluência do discurso musical, e sem se prender a uma descrição exaustiva e minuciosa do texto, preferindo antes ilustrar sua essência e significado geral. Nesta época já começava a se declarar uma controvérsia pública entre os adeptos da polifonia tradicional e os defensores do novo estilo monódico e expressivo. O primeiro partido declarava que a música era a senhora da palavra (Harmonia orationis Domina est), e o segundo, o contrário, que o texto devria orientar a composição musical (Oratio harmoniae Domina absolutissima), e Monteverdi se engajou no debate por instigação de um teórico conservador, Giovanni Maria Artusi, que condenou o uso em sua música de frequentes dissonâncias, intervalos inadequados, cromatismos, ambiguidade modal e a presença de trechos próximos da declamação. Disse que "a música feita pelos antigos produzia efeitos maravilhosos sem essas brincadeiras, mas esta é apenas insensatez". Monteverdi se viu obrigado a fazer uma defesa pública de seus trabalhos através de um manifesto, que incluiu como um apêndice de seu quinto livro de madrigais, onde falou:

        "Eu não componho minhas obras através do acaso... A respeito das consonâncias e dissonâncias, existe uma outra maneira de considerá-las, além da forma tradicional, a qual, satisfazendo tanto a razão como os sentidos, defende o modo moderno de compor... O compositor moderno constrói sobre os alicerces da verdade".

Continuava dizendo que não se via como um revolucionário, e que seguia uma tradição de experimentalismo que já tinha mais de 50 anos, que buscava criar uma união entre música e palavra, e que pretendia comover o ouvinte. Nessa pesquisa, acrescentou, para que o efeito emocional fosse mais poderoso e fiel, algumas convenções rígidas deviam ser sacrificadas, mas acreditava que a música tinha autonomia, como acreditavam os antigos polifonistas como Josquin des Prez e Giovanni da Palestrina. Com isso ele estabeleceu a validade de ambas as correntes, a tradicional, a prima pratica, que privilegiava a música sobre a palavra, e a vanguardista, chamada de seconda pratica, que defendia a primazia do texto. Sua opinião se tornou de enorme influência na discussão teórica da época e ele continuou trabalhando com ambas as estéticas por toda a sua vida.

Em 1607, já famoso pelos seus madrigais e como um dos líderes da vanguarda, teve sua reputação consolidada pela apresentação de sua primeira ópera, L'Orfeo, favola in musica. Com toda probabilidade ele se aventurou nesse gênero após entrar em contato com a produção dos florentinos Jacopo Peri e Giulio Caccini, que estavam fazendo uma tentativa de reconstruir o teatro musicado da Grécia Antiga, e cujo resultado foi o desenvolvimento de um estilo de composição dramática com recitativos e árias que foi a origem da ópera. Monteverdi também pode ter feito alguns experimentos prévios, não documentados, mas seja como for com L'Orfeo ele já apareceu à frente dos florentinos, com uma concepção cênica e um estilo musical muito mais integrados, flexíveis e poderosos, combinando a opulência dos espetáculos teatrais renascentistas com uma grande veia declamatória nos recitativos e árias, enquanto que seus coros assumem uma função importante como comentaristas da ação dos protagonistas. Usando um grande grupo instrumental, foi capaz de criar uma rica variedade de atmosferas para ilustração musical das cenas e enfatização de seu conteúdo emocional.

Poucos meses depois da estréia de L'Orfeo, perdeu sua esposa e entrou em depressão, retirando-se para a casa de seu pai em Cremona. Quase imediatamente, seu patrão requisitou sua volta, a fim de que compusesse uma nova ópera, Arianna, para celebrar o casamento de seu herdeiro Francesco Gonzaga, com Margarida de Sabóia. Teve de compor ainda um bailado e música incidental para uma peça de teatro. E enquanto a ópera estava sendo ensaiada, a soprano principal faleceu, e ele teve de adaptar toda a sua parte. Foi finalmente encenada em maio de 1608, com imenso sucesso. Infelizmente a partitura se perdeu, salvo uma ária, o famoso Lamento, que foi transmitido por várias fontes. Depois de terminar suas obrigações, voltou para Cremona em um estado de exaustão, que perdurou por um bom tempo. Foi intimado a voltar para Mântua no fim de 1608, mas recusou-se, só comparecendo mais tarde, e desde então passou a mostrar sinais evidentes de descontentamento, considerando-se mal pago e desprestigiado. Não cessou de compor, mas sua produção do ano seguinte trai seu estado de ânimo sombrio. Em 1610 publicou uma coleção de peças para as Vésperas da Virgem Maria, Vespro della Beata Vergine, incluindo uma missa em prima pratica, que representa o coroamento de sua obra no estilo antigo, com grandes qualidades estéticas e enorme ciência contrapontística. As outras peças, mais modernas, são da mesma forma obras-primas, compondo um amplo painel de todos os tratamentos possíveis em seu tempo para a música sacra, com peças para voz solo, corais e interlúdios instrumentais, com um completo domínio do estilo suntuoso da música coral veneziana, e cujo efeito é grandioso e impactante.

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