O Churrasco Que não Era
São quatro horas de uma madrugada fria de inverno. Na ponte Hercílio Luz, um homem com barba desgrenhada balança as pernas na beirada. Não há carros; só silêncio e o balançar lento dos seus pés.
— Posso me sentar aqui do lado? — Pergunta um andarilho.
O homem de barba grisalha não responde. Sequer olha para ele. O andarilho senta um pouco longe. Não quer forçar a barra.
— Não tá pensando em pular, né?
— Foi um churrasco.
— Um churrasco?
— Um deles. Na época do Covid.
— Um churrasco…
— De Dia das Mães. Lá em casa era tradição, sabe. Todo ano reunir todo mundo. É difícil ficar longe.
— Então foi o churrasco…
— Eu achava que sim. É mais fácil culpar um vírus quando você perde esposa, mãe, sogra, tios, tudo de uma vez. Agora eu sei que fui eu. Eu insisti.
— Então não foi o churrasco…
— Não foi o churrasco.
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